Louis
Aragon nasceu em 1897, em Paris. Porque dispensa maiores apresentações (é um
dos mais lidos e traduzidos poetas franceses do século XX), vamos direto ao
poema aqui traduzido: em 8 de fevereiro de 1958, a força aérea francesa
bombardeava a cidade de Sakiet-Sidi-Youssef,
em se escondia parte da FLN. Entre mortos e feridos, Aragon publica em no Lettres
françaises de 19 de fevereiro o poema “Sakiet”, que viria a ser posteriormente
publicado com o nome de “Échardes”.
Farpas
Tradução:
Thiago Mattos
I
Então
chega de gemer. Nada mais ridículo
Do
que um homem que geme
Se
não for um homem que chora
II
Passeio
com
uma faca dobrável em mim
Passeio
com
um
gato na memória
Passeio
com
um vaso de flores murchas
Passeio
com
uma roupa irreparável
Passeio
com
um grande buraco no coração
III
Acredite
Nada
faz tão mal quanto se pensa
IV
Mais
o poema é curto
Mais
entra na carne
V
É
preciso banir da cidade esse poeta
Não
tem na cidade lugar
Para
o exemplo da dor
VI
Tudo
fizemos para os que sufocam
Para
os que pedem ar
Construímos
janelas na noite
Abrimos
todos os dispensários
Poupe-nos
desse barulho de lamentação
VII
Nunca
haverá nada tão bonito quanto um sorriso
Mesmo
sobre um rosto desfigurado
Você
não tem medo de ser bonito
VIII
Leva para fora
esses passos feridos
IX
Como você tem
razão de desviar os olhos
Do que sangra
X
Tudo está
perfeitamente no lugar
Ou tudo pelo
menos tudo estará
XI
Mendigo
Lava essa tua
mão estendida
XII
Quem diz Tenho
dor
Se esquece dos
outros
XIII
Não basta se
calar
É preciso saber
dizer outra coisa
XIV
Maldita seja a
planta
Que não deleita
os olhos
O poeta não tem
o direito
De assim
continuar sem florir
XV
Não há chaga
Que um pouco de
pintura
Não transforme
em boca
De grito que se
possa curvar
O único crime é
a discordância
XVI
Falo assim para
os que não podem dormir
Não estão
sozinhos, porque com eles pareço
Falo assim para
os que não conseguem morrer
Por que vem me
dizer que sou egoísta
XVII
A vida é cheia
de farpas
E é no entanto
a vida
XVIII
E faz bem às
vezes de noite gritar
XIX
Mais uma vez
entre você e o espelho
Há agora esses
olhos de criança morta
XX
Conhece o nome
da vergonha
XXI
Tentem enfiar
num verso francês
Esta palavra
como um punhal Sakiet-Sidi-Youssef
Farpas
ARAGON, Louis. Oeuvres
poétiques complètes II. Paris : Gallimard, 2008, p. 1129-1130.
I
Cesse donc de gémir Rien de plus ridicule
Qu’un homme qui gémit
Si ce n’est un homme qui pleure
II
Je me promène avec
Un couteau d’ombre en moi
Je me promène avec
Un chat dans ma mémoire
Je me promène avec
Un pot de fleurs fanées
Et des photos jaunies
Je me promène avec
Un vêtement irréparable
Je me promène avec
Un grand trou dans mon cœur
III
Crois moi
Rien ne fait si mal qu’on pense
IV
Plus le poème est court
Plus il entre en la chair
V
Il faut chasser de la cité ce poète
Il n’ya pas dans la cité de place
Pour l’exemple de la douleur
VI
Nous avons tout fait pour ceux qui étouffent
Tout fait pour ceux qui demandent de l’air
Construit sur la nuit des fenêtres
Ouvert partout des dispensaires
Epargnez-nous ce bruit de plaintes
VII
Il n’ya jamais rien de si beau qu’un sourire
Et même avec un visage défiguré
N’as-tu pas souci d’être beau
VIII
Portez ailleurs ces pas blessés
IX
Comme vous avez raison de détourner les yeux
De ce qui saigne
X
Tout est parfaitement à sa place
Ou tout au moins tout y sera
XI
Mendiant
Lave ta main tendue
XII
Qui dit J’ai mal
Oublie les autres
XIII
Il ne suffit pas de se taire
Il faut savoir dire autre chose
XIV
Maudite soit la plante
Qui ne réjouit pas les yeux
Le poète n’a pas le droit
D’ainsi demeurer sans fleurir
XV
Il n’est pas de plaie
Qu’un peu de fard
Ne fasse bouche
De cri qu’on ne puisse infléchir
Le seul crime est la discordance
XVI
Je parle aussi pour ceux qui ne peuvent dormir
Ils ne sont pas seuls si je leur ressemble
Je parle aussi pour ceux qui ont mal à mourir
Pourquoi dites-vous que je suis un égoïste
XVII
La vie est pleine d’échardes
Elle est pourtant la vie
XVIII
Et cela fait du bien la nuit parfois crier
XIX
Une fois de plus entre le miroir et toi
Il y a désormais ces yeux des enfants morts
XX
Connais-tu le nom de la honte
XXI
Essayez de faire entrer dans un vers français
Ce mot comme un poignard Sakiet-Sidi-Youssef
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