28 de julho de 2013

Edmond Jabès: A água [L'eau]



Edmond Jabès nasceu no Cairo, em 1912, e morreu em Paris, em 1991. Apesar de ser mais comumente localizado no âmbito da poesia francesa, a presença de temas e paisagens do Egito é marcante na sua poesia. Sua obra é extensa e variada, e recebeu textos críticos de nomes como Derrida, Blanchot e Levinas.
Uma outra tradução (de Ivo Barroso) do poema abaixo pode ser encontrada em http://www.dicta.com.br/edicoes/edicao-4/alguns-poetas-de-expressao-francesa/



A água
Tradução de Thiago Mattos

Antes, há a água.
Depois, há a água;
durante, sempre durante.

- A água do lago?
- A água do rio?
- A água do mar?

Jamais a água sobre a água.
Jamais a água pela água;
mas a água onde não há mais água;
mas a água na memória morta da água.

Viver na morte viva
entre a lembrança e o esquecimento da água,
entre
a sede e a sede.
A água entre
Cerimônia.
A água se instala
e flui:
Fertilidade.
Sempre a água pela água.
Sempre a água sobre a água.
Abundância.

- O deserto foi minha terra.
O deserto é minha viagem, minha errância.

Sempre entre dois horizontes;
entre horizonte e
apelos de horizontes.
Além-fronteiras.

A areia brilha como a água
na sede inextinguível.
Tormento que a noite adormece.
Nossos passos fazem jorrar a sede.
Ausência.

- A água do lago?
- A água do rio?
- A água do mar?

Logo virá a chuva
para lavar a alma dos mortos.
Deixem passar as sombras queimadas,
as manhãs de árvores sacrificadas.
Fumaça. Fumaça.



L’eau

Avant, il y a l'eau.
Après, il y a l'eau ;
durant, toujours durant.

- L'eau du lac ?
- L'eau de la rivière ?
- L'eau de la mer ?

Jamais l'eau sur l'eau.
Jamais l'eau pour l'eau ;
mais l'eau où il n'y a plus d'eau ;
mais l'eau dans la mémoire morte de l'eau.

Vivre dans la mort vive
entre le souvenir et l'oubli de l'eau,
entre
la soif et la soif.
L'eau entre
Cérémonie.
L'eau s'installe
et coule :
Fertilité.
Toujours l'eau pour l'eau.
Toujours l'eau sur l'eau.
Abondance.

- Le désert fut ma terre.
Le désert est mon voyage, mon errance.

Toujours entre deux horizons ;
entre horizon et
appels d'horizons.
Outre-frontière.

Le sable brille comme l'eau
dans la soif inextinguible.
Tourment que la nuit endort.
Nos pas font gicler la soif.
Absence.

- L'eau du lac ?
- L'eau de la rivière ?
- L'eau de la mer ?

Viendra, bientôt, la pluie
pour laver l'âme des morts.
Laissez passer les ombres brûlées,
les matins aux arbres sacrifiés.
Fumée. Fumée.

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